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Desrespeito

14.03.16

 

 

Como se distinguem as pessoas que não merecem respeito? Uma resposta clara a esta questão teria muita utilidade, ajudaria a avaliar a legitimidade das faltas de respeito.

 

Nas redações da catequese e nas conversas sobre o boletim meteorológico, toda a gente merece respeito. No mundo real, não é assim. Hoje, o desenvolvimento tecnológico permite-nos novas formas de desrespeitar os outros. As formas antigas não perderam atualidade, continuam disponíveis para os nostálgicos, mas acrescentaram-se muitas outras, mais confortáveis e eficazes para quem desrespeita.

 

Ao contrário do que Salazar apreciava, "respeito" não é sinónimo de "obediência" ou "submissão". "Respeito" é sinónimo de "consideração", s. m., é aceitar que os outros, independentemente de se concordar ou não com eles, têm o direito de existir.

 

Desrespeitar é negar o direito de existir, desrespeitar é uma forma de aniquilação moral. As diferenças entre desrespeito e opinião são muito mais concretas do que as apologias do desrespeito querem fazer crer. O desrespeito começa por ser um sentimento e, só depois, se exprime em palavras ou ações. Quando não é gratuito, o desrespeito nasce de uma dor: em algum momento, o desrespeitado lembrou o desrespeitador de algo que o incomoda em relação a si próprio. Nesse caso, o desrespeito é uma resposta. No entanto, não tem a ver com a pessoa a que se dirige, com aquilo que ela é, tem a ver com a imagem construída por aquele que desrespeita, tem a ver com aquele que desrespeita.

 

Ainda assim, hoje, vende-se o desrespeito muito barato. Desrespeita-se os outros em troca de uma gargalhada murcha, de um semi-sorriso, da convicção vaga de que esse desrespeito será identificado como inteligência e perspicácia. Independentemente da gratificação em causa, o desrespeito é sempre egoísta, é sempre um sinal de narcisismo e de vaidade.

 

Neste tempo, o desrespeito é também um sinal da crise. Há quem desrespeite como modo precário de vida. O mesmo desespero que leva jovens licenciados a estágios não remunerados e a call centers, leva muita gente ao desrespeito. Uns e outros acreditam que, aí, conseguirão encontrar alguma coisa que os salve do nada que vislumbram à sua volta.

 

Em qualquer dos casos, o desrespeito é uma agressão. O desrespeito é sempre uma agressão.

 

 

 

José Luís Peixoto, in Notícias Magazine, 13 de março de 2016

 

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